A “folclorização” da desigualdade
Publicado em 07/03/2011 | MARIA RITA CESARTemos, como tantas outras, uma data a mais neste calendário “folclorizado” que se esqueceu da história política. É importante ressaltar que o dia 8 de março só faz sentido se lembrado no interior das lutas feministas do passado e do presente
Neste 8 de março de 2011 teremos uma importante conquista a ser comemorada. O Brasil tem sua primeira “presidenta”. Uma mulher com trajetória política própria, não a “esposa”, “mãe”, “filha” ou “afilhada” de um homem político que estendeu seus tentáculos de poder.
Em seu primeiro discurso Dilma fez uma declaração feminista e agora uma garotinha poderá sonhar em ser presidenta da República. Entretanto, um século após as primeiras celebrações do dia internacional da mulher, ainda há muita desigualdade e violência. A origem da data é um pouco incerta, decorre em especial das manifestações de mulheres trabalhadoras na Rússia, consideradas um dos estopins da revolução russa (1917). Também o incêndio que matou centenas de trabalhadoras em greve na fábrica Triangle, em Nova York (1911), é uma data a ser lembrada.
As várias origens convergem para reivindicações de mulheres por uma vida menos desigual e mais digna. O movimento feminista reavivou a data no conjunto das suas lutas, na década de 60, lembrando que as mulheres há muito lutam por igualdade e dignidade. No interior dos processos de despolitização da sociedade, o 8 de março se tornou apenas mais uma data comemorativa que vende rosas e bombons para chefes, companheiros e namorados “sensíveis”.
Temos, como tantas outras, uma data a mais neste calendário “folclorizado” que se esqueceu da história política. É importante ressaltar que o dia 8 de março só faz sentido se lembrado no interior das lutas feministas do passado e do presente. Temos razões para comemorações? Por um lado, sim – além da Presidência da República, a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), criada em 2003, e a criação de políticas educacionais que combatem a desigualdade de gênero.
Por outro lado, não há razão para comemorações – a violência contra as mulheres continua fazendo suas vítimas, muitas delas fatais, há muitas mulheres ainda sem acesso aos equipamentos básicos de saúde e educação, e o corpo feminino permanece um território de tutela política e jurídica masculina, impedindo que as mulheres possam realizar livremente suas escolhas.
No cruzamento com outros marcadores como raça/etnia, classe e orientação sexual, sabe-se que contra as mulheres negras, pobres, lésbicas, a desigualdade e a violência é ainda maior. Celebrar o dia 8 de março? Talvez, se for possível a restituição do caráter político das lutas feministas que deram origem à comemoração e ainda inspiram o combate à desigualdade e violência.
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