segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Jovem e Bela, de François Ozon.


Jovem e Bela, de Fançois Ozon, é mais um filme em que o sexo quase explícito é posto em cena de maneira perturbadora, como em Ninfomaníaca, de Lars von Trier. Claro que o elemento perturbador não é a própria exposição do sexo. Quem hoje em dia se chocar com isso vive em não sei qual mundo ou época e melhor faria se deixasse sua hipocrisia de lado. Nos dois filmes, o que impressiona é a total desvinculação entre sexo, prazer, erotismo, fantasia e amor. Se fossem filmes moralistas, Jovem e Bela e Ninfomaníaca não fariam mais que repetir uma desgastada crítica à ruptura contemporânea entre amor e sexo, reiterando um antiquado sermão. Mas não se trata de reprimenda moral, e sim de examinar, sem emitir juízos apressados, uma experiência para a qual talvez ainda não tenhamos nome nem saibamos ao certo quais as suas consequências: a experiência do sexo (desenfreado) empregado como arma de recusa (Bela e Jovem) ou de destruição (Ninfomaníaca) de velhos mitos, como o do amor romântico e sua consequência social, os vínculos da família burguesa. É como se Ozon e von Trier nos oferecessem um diagnóstico social (e não existencial ou singular) para algo que certamente já está ocorrendo em massa: o sexo como antídoto contra formas esclerosadas de vínculo, de relação, de amor, de amizade e de família. Tampouco me parece que estejamos às voltas com os velhos temas da transgressão, do desejo, da busca do prazer pelo prazer ou da crítica libertina aos bons sentimentos, pois isso ainda pressupunha a integridade moral daquilo que se pretendia destruir. E Ozon é absolutamente claro a esse respeito: da família, restam apenas algumas convenções, pequenos ritos, tradições e traições. No entanto, ao que parece o referido experimento destina os experimentadores ao isolamento e à anestesia, à ruptura de toda afetividade. Em termos afetivos, ao longo do filme de Ozon resta apenas alguma cumplicidade entre os irmãos, Isabelle e Victor; e a bela cena em que Isabelle se encontra com a viúva de um antigo cliente, e as duas se limitam a deitar-se em silêncio na cama do hotel, uma ao lado da outra. Os dois filmes mostram que estamos diante de um tremendo dilema: de fato, do velho amor romântico já não resta senão a reiteração mecânica e publicitária, fantasmática, incapaz de seduzir quem quer que desconfie da hipocrisia do romantismo e das teias grudentas do ambiente familiar. Por outro lado, ao usar e abusar do sexo para recusar ou destruir tais vínculos e teias, parece que corremos o risco de cair no vazio mais desesperançado e assustador, um abismo anti-afetivo generalizado. Assim, os dois filmes nos confrontam com a urgente necessidade de reinventar a relação entre sexo, amor, amizade, desejo e comunidade, se é que já não é tarde demais... De todo modo, o assunto é intrigante e pretendo voltar a ele num post mais longo.





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